Se você leu sobre o comecinho de nossa viagem a Valparaíso e Viña Del Mar deve ter percebido que ainda não falei de comida. Esse é o lado ruim de conhecer as duas cidades em uma excursão. Por conta própria, você faz a programação que quiser e para na hora que bem entender para comer. Com um grupo de turistas, é preciso dar uma segurada na fome. No nosso caso, só paramos para almoçar em Viña e, mesmo assim, bem depois do meio-dia.
Depois de percorrer Valparaíso, nosso guia turístico nos levou para um rápido passeio por Viña Del Mar. Digo rápido porque acho que passamos tempo demais na primeira cidade e o que sobrou para a segunda foi muito pouco. Não me lembro a distância entre os dois municípios, mas o trajeto é rápido. É como se fosse Recife-Olinda ou Niterói-São Gonçalo, isto é, são cidades-irmãs e bem próximas.
Em Viña, junto com os outros turistas, comemos em uma restaurante muito bacana: La Gran Mazana. O local é pequeno, mas bem acolhedor, e a especialidade são os frutos do mar. Apesar de estar na terra do vinho, fui de cerveja Cristal. Após a correria para trocar dinheiro (ainda em Santiago), ir à rodoviária, encarar 1h30 de viagem e bater perna por Valparaíso, tudo o que eu precisava era forrar o estômago e molhar a garganta.
Se tivesse escrito este texto mais perto da viagem, talvez me lembrasse do quanto gastamos no restaurante. Mas as notas fiscais se foram e os detalhes também. O que me lembro é que valeu cada peso gasto porque a comida era realmente deliciosa, a fome era grande e as férias pediam um pouco de desprendimento financeiro. Bem alimentados, pudemos enfim conhecer Viña Del Mar.
Em comum com Valparaíso, Viña só tem o fato de ser banhada pelo Pacífico. Na comparação entre as duas, podemos dizer que Viña é a prima rica. Há, claro, uma parte desorganizada, sobretudo no centro, mas visualmente e turisticamente ela é mais interessante. Se você tiver tempo e dinheiro, vale a pena passar uma noite na cidade para aproveitar os bares e boates de lá. Há uma rua repleta de estabelecimentos com toda sorte de bebida, alimentação e diversão.
Logo no começo do nosso passeio, paramos para conhecer o famoso relógio de flores de Viña. O local é bonito, mas confesso que não me empolgo com esse tipo de atrativo. Para quem curte plantas ou paisagismo é o ponto ideal para tirar umas fotos.
Como chegamos a Viña meio tarde, o nosso passeio foi um pouco prejudicado. Visitamos o Museo Arqueologico já quase sem luz natural e nossas fotos com um dos poucos Moais originais fora da Ilha de Pascoa saíram uma negação, por exemplo. Além do Museo, fomos ao Parque Vergara, um grandioso espaço ao ar livre que foi a residência de uma das famílias mais ricas do Chile. Pelo tamanho do parque, entenda muito muito muito rica.
É no Parque Vergara que fica o anfiteatro a céu aberto onde ocorre o Festival Internacional da Canção de Viña del Mar. O guia logo tratou de nos dar dois avisos importantes: o teatro foi um dos mais atingidos por um dos inúmeros terremotos que de tempos em tempos fazem o Chile sacudir e um dos músicos que mais fazem sucesso no Festival de Viña é ninguém menos que ele, o meu, o seu, o nosso, o inimitável Roberto Carlos. Veja um vídeo com o Rei encantando o povo no Parque Vergara em 2011.
Além de Roberto Carlos, nosso simpático guia também explicou que quem também levou milhares de chilenos à loucura, em um passado remoto, foi Xuxa. Embora conheça pouco sobre a música latino-americana, fiquei curioso para acompanhar uma edição do evento de perto. A festa é grandiosa e transmitida para todo o país. Aqui, mais informações sobre a edição de 2014 daquele que é considerado “o festival dos festivais”.
Por conta própria
Saímos de Viña um pouco frustrados pela rapidez do passeio e por isso resolvemos voltar à cidade outro dia, por conta própria. Tomamos o metrô até o terminal de ônibus, mas quando chegamos lá fomos direto ao guichê da Turbus comprar nossas passagens. Já éramos gente grande no Chile e dispensamos guias turísticos ou atravessadores que nos foram úteis em Valparaíso, mas nem tanto em Viña.
Assim que desembarcamos no terminal de ônibus Viña, fomos abordados por um simpático senhor com um crachá de guia turístico municipal. Ele muito gentilmente nos deu uma mapa da cidade e logo descobrimos a razão de tanta educação. Segundo o guia, só era possível chegar às praias da cidade em um taxi porque a orla era muito distante de onde estávamos. Então, nos apresentou um taxista que disse que era o nosso dia de sorte, pois o movimento de turistas estava fraco e ele faria a corrida por “módicos” CLP$ 4.000 . Para efeito de comparação, acho que a passagem de Santiago para Viña, com 1h30 de viagem, ida e volta, custou pouco mais de CLP$ 5.000. Amigos, não caiam nesse golpe do “la garantia soy yo”.
Já escolado na malandragem chilena, peguei o mapa, agradeci pela disponibilidade e dei um sonoro NO, GRACIAS. Viña Del Mar me parecia pequena e não era possível que o terminal de ônibus fosse tão distante da praia. Resolvemos procurar o ponto de ônibus mais próximo e quando entramos em um açougue para perguntar qual a linha ideal para nos deixar na orla o funcionário sorriu aquele sorriso de quem ouviu uma asneira e disse que bastava andar cerca de 10 ou 15 minutos para chegar ao destino.
Andamos pelo caminho indicado pelo açougueiro e quando a dúvida batia parávamos em outro estabelecimento para nos certificar se era o trajeto correto. Recebemos um OK em todos os locais. Não tinha mesmo mistério. Basta andar pela avenida principal de Viña, a que corta o centro, depois dobrar em uma rua no fim dessa via, atravessar uma ponte e correr para o abraço.
O centro de Viña é como o centro de Valparaíso ou do Recife. Muita gente nas ruas, trânsito, comércio formal e informal a todo o vapor. Mas quando atravessamos a ponte uma outra cidade surgiu. Podemos ver aquilo que ficou escondido na nossa primeira passagem por Viña. A pé e de dia, tivemos uma imagem da cidade mais perto da realidade.
Demos sorte que o dia estava um pouco ensolarado e, pela primeira vez desde que chegamos ao Chile, senti calor. Não aquele calor recifense, mas o suficiente para tirar boa parte dos trambolhos que vestia. O cassino de Viña, um patrimônio da cidade, fica bem em frente ao Oceano Pacífico na Avenida San Martín, 199 e chama a atenção por sua imponência arquitetônica. Hoje, ele divide espaço com um hotel de luxo. Mais informações aqui: www.casinodevinadelmar.cl.
Nessa segunda passagem por Viña também curtimos as áreas verdes. Elas são um convite para o descanso ou um piquenique e para passeios com cachorros ou crianças.
A orla de Viña perde em beleza para a orla do Nordeste ou do Rio de Janeiro e sobre isso não há discussão, mas ainda assim o cenário, embora um pouco triste no inverno, foi encantador de alguma forma. Para mim, talvez pelo fato de ser algo tão diferente do que já tinha visto pessoalmente. Na hora de tirar fotos em frente ao muro de arrecifes que separa o mar do calçadão, fique atento às ondas. Elas batem forte contra as rochas e podem molhar os turistas mais desligados.
Depois de margear a praia pelo calçadão, desci para a areia para realizar o sonho doido de molhar as mãos no Pacífico e tirar um foto. O mar recuou como quem não quer nada voltou como quem quer tudo para me molhar impiedosamente. O resultado: fiz o resto do passeio com os sapatos e uma parte da calça jeans molhados e com um frio dos infernos. Eu queria um registro do Pacífico e agora iria voltar para Santiago com uma parte do oceano dentro do tênis.
A praia de Viña me pareceu triste com pouca gente na areia e apenas uns cinco adolescentes dentro d´água, desafiando as placas de proibição. Não sei como eles agüentavam o frio ou a força da correnteza. Eu certamente não desafiaria o Pacífico daquele jeito (também já me bastava a peça que o oceano maroto me pregou). Na orla, algumas poucas barracas de lembrancinhas capitaneadas por hippies e prédios sem calor humano.
Pelos relatos e fotos que vi em alguns blogs, essa frieza da orla de Viña tem tudo a ver com a época do ano. No verão, a praia é tomada por gente e o clima certamente é outro, mais colorido e festivo. Fizemos o caminho de volta por uma avenida paralela à via que margeia o oceano (a Av. San Martín) e vimos que realmente estávamos na parte rica da cidade, com suas avenidas largas, ruas arborizadas e quadras bem ao estilo americano.
Já estávamos preparados para gastar os tubos no almoço, mas achamos um local bem simples em meio a tantos restaurantes luxuosos que prometia oferecer uma refeição genuinamente caseira. Por sorte, o barato não saiu caro e comemos muito bem. Achei a comida muito gostosa e Vanessa também aprovou, vendo semelhanças entre a refeição e o almoço da própria casa. A propaganda estava certa.
No retorno à rodoviária, Vanessa me convenceu a comprar uma meia no camelô para evitar o frio, o chulé e uma gripe. Reclamei do preço (e na verdade nem era caro), mas aqui é preciso dar o braço a torcer una vez más: a meia é uma das melhores que já tive em toda a minha vida e tornou a volta muito mais confortável, pois eu já não agüentava mais os pés molhados e cheios de areia do Pacífico. Retornamos cansados e felizes a Santiago porque fizemos a aposta certa de conhecer Viña por conta própria e porque não caímos no conto do vigário assim que chegamos à cidade.
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